Ando
ouvindo vozes. Muitas delas.
Ouvi a
voz das delicadas mãozinhas de distinta senhorita de sorriso tão
roxo que quase cantava: “ei você, cara de coelho!”
Ouvi a
voz do tilintar rouco dos canecos da Baviera ecoando por entre as
longas mesas de meus sonhos festivos.
Ouvi a
voz de minha família no correr fervido de meu sangue e nas rugas de
minha testa.
Ouvi a
voz absorta dos buracos negros ao largo, aguardando com funesta
paciência o devir dos tempos.
Ouvi a
voz azul¹ da coroa de minha bicicleta.
Ouvi a
voz muda do espaço explodindo nos limites da existência.
Ouvi a
voz do passado sob meus pés, derretendo a sola de meus sapatos e
envolvendo minhas pernas com unhas-de-gato pré-históricas.
Ouvi tudo
isso em todas as línguas que ainda nem me existiram e compreendi nos
pormenores cada silabazinha. Todas as vozes desses espíritos me
voaram desconexas:
“À
vida!”
“À
vida!”
“À
vida!”
___
¹ O
azul me faz querer ser bicho de asas, penas e visão menos turva.
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