Pensava
em suas coxas com a cabeça apoiada no vidro. Não podia ser
diferente numa viagem daquelas, exaustiva como manda o figurino:
houve constrangimento. O camarada a meu lado finge que não vê.
Cruzo as pernas num sufoco fictício pela privacidade. Não bastasse
o jeans que me estrangula o sangue, também o faz o ambiente: somos
castos por sociedade. Milhas e oceanos são nada: a infelizmência
mora aqui. Nas sombras de minha exasperação, ao menos, reside o
humano. Se sou reflexo? Ora, claro que sim: todos são: quantos são
os que experienciam o além ereção? Poucos, se nenhum. Fizeram-nos,
sabe-se lá quem, sombra às potências. Estamos contentes com uma
broxada como estamos contentes com um emprego de merda. Choramos tão
pouco uma foda não concretizada quanto um gordo que não pode contar
os dedos de seu próprio pé e vê em sua mãe a própria fotografia,
tirada num universo paralelo. Tanto faz. Caminhamos à ilusão de
dias melhores, mas estão nos dias melhores aqueles que vivem de
remédios para manterem-se firmes e dispostos a saciar tudo que não
seja tesão; nem o próprio, nem o do outro. Não dará um pico para
evitar o vício. Jamais será amarga sua garganta, pois teme
depressão. Fungos são perigosos. Mas fluxetina e ritalina são
dádivas farmacêuticas. Está morto, pois tem medo! Tem medo de
gozar, de gostar, de gamar. Errar com Deus é errar consigo mesmo,
pois do divino são feitas nossas tripas. Nem podia ser diferente:
somos Sua imagem e semelhança. A calça bem abaixo do umbigo, a saia
justa, a boca entreaberta: nada profetiza tão bem o desejo como a
verdade inexistente. Inexistimos. Se não broxasse, existiria. Sou
humano: não existo. Do mais da espécie, tenho a condição: não me
deixar ser, nem um, nem outro: apenas não. Somos criados para não
ser: temos o pau mole, a calcinha seca, a luxúria falida, a revolta
revogada, a raiva contida, o pavor exarcebado. Somos tão nada que
nem sabemos.
domingo, 15 de janeiro de 2012
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário