domingo, 15 de janeiro de 2012

das ereções perdidas


Pensava em suas coxas com a cabeça apoiada no vidro. Não podia ser diferente numa viagem daquelas, exaustiva como manda o figurino: houve constrangimento. O camarada a meu lado finge que não vê. Cruzo as pernas num sufoco fictício pela privacidade. Não bastasse o jeans que me estrangula o sangue, também o faz o ambiente: somos castos por sociedade. Milhas e oceanos são nada: a infelizmência mora aqui. Nas sombras de minha exasperação, ao menos, reside o humano. Se sou reflexo? Ora, claro que sim: todos são: quantos são os que experienciam o além ereção? Poucos, se nenhum. Fizeram-nos, sabe-se lá quem, sombra às potências. Estamos contentes com uma broxada como estamos contentes com um emprego de merda. Choramos tão pouco uma foda não concretizada quanto um gordo que não pode contar os dedos de seu próprio pé e vê em sua mãe a própria fotografia, tirada num universo paralelo. Tanto faz. Caminhamos à ilusão de dias melhores, mas estão nos dias melhores aqueles que vivem de remédios para manterem-se firmes e dispostos a saciar tudo que não seja tesão; nem o próprio, nem o do outro. Não dará um pico para evitar o vício. Jamais será amarga sua garganta, pois teme depressão. Fungos são perigosos. Mas fluxetina e ritalina são dádivas farmacêuticas. Está morto, pois tem medo! Tem medo de gozar, de gostar, de gamar. Errar com Deus é errar consigo mesmo, pois do divino são feitas nossas tripas. Nem podia ser diferente: somos Sua imagem e semelhança. A calça bem abaixo do umbigo, a saia justa, a boca entreaberta: nada profetiza tão bem o desejo como a verdade inexistente. Inexistimos. Se não broxasse, existiria. Sou humano: não existo. Do mais da espécie, tenho a condição: não me deixar ser, nem um, nem outro: apenas não. Somos criados para não ser: temos o pau mole, a calcinha seca, a luxúria falida, a revolta revogada, a raiva contida, o pavor exarcebado. Somos tão nada que nem sabemos.

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