quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

insisto

o cérebro afina ao vento
que passa violênto como rojão
que morde a relação
mas que insiste
reteso
ao mundo que persiste, insisto
em me semear despejo.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

vergonha na cara

minha gata lambia há pouco a própria bunda. perguntei se ela não tinha vergonha na cara. ela disse que não. subiu no meu colo, lambeu-me o queixo, nos abraçamos e deitou em meu colo ronronando.

sobre barbearias e garrafas verdes

Aquilo tudo que os idiotas podem me dizer possui uma força tremenda de indução. Passo horas me perguntando sobre o ponto, a finalidade. Suas barbas castradas em barbearias modernas, estilizadas por agências de publicidade repletas de manés em suas barbas cortadas nas barbearias que decoraram e por isso tão top, destino certo de seus erários acumulados nas 20 horas extras daquela semana mal dormida, empurrada por estimulantes não recreativos na maquinha fofa de expresso falso tão bem desenhada por colegas seus de tão bem cortadas barbas e tão bem destinados erários. De suas casas-escritórios saem pilhados, atolados em suas apertadas calças de camurça, empunhando como troféus suas verdes garrafas, emplacadas por campanhas publicitárias repletas de barbas tão bem feitas e camisas xadrez tão engomadas que nem disfarçam a dependência de suas mães, objeto-amor-dependência de quem atravessou a pós-modernidade sem perder o desprezo pelas mulheres, estuprando-as em baladas que de tão top e intimistas, intimidam por tanta esterilidade e abjeção ao que não é engomado, xadrez e castrado em modernas barbearias da não tão baixa Augusta. Baladas tão intimistas quanto top que filas são desfiles e nem drogas decentes circulam, se não as garrafas verdes e com sorte alguém que comprou de alguém que conhece alguém de tal alguém que aparece com um pouco de fumo, mas de tão pastel e tão intimista e top a balada que não será sequer aceso. Memórias fugazes e silicamente eternas costuradas por discursos anti-modernos atrás de celulares maiores que os bolsos de suas calças de camurça marrom, ganhando a noite em poucas palavras cuspidas em caracteres e curtidas tão vagas quanto suas barbas. Discurso político alinhado, ganhando o salão intimista através de tons pastéis e letrinhas saídas de fofos seriados de garotinhas e garotinhos que tocam violão e cantam musiquinhas modernas convincentes pois alinhadas, atrás de barbas bem castradas e camisas xadrez e vestidinhos da Vila Madá. O caminho de casa transformado em letra U nos celulares, catalizadores criativos do que desenrolara na balada top: uma campanha publicitária sobre garrafas verdes e barbas bem-feitas enfeitando a balada top.

sexta-feira, 1 de maio de 2015

do novo poema da cabeça esquecida

A cabeça que
segura na cabeceira, não
se indispõe com seu par.
Somos dois pois irmãos,
irmãs na enxada.

---

Aberrado com os seus, de
espírito limitante.
Vontade mesmo, pensou
em si,
era nem sobrar um nem outro:
"cairia um a um, uma a uma".

---

Foda-se. Ainda
ouço minhas gatas. A comida delas
vale mais que essa
almofada de passarinhos.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

dos dias assim

Em dias assim, de garoa fina, a praia se torna infinita. Reconheço a areia e seu encontro com o mar, mas este se conjuga com o céu, também cinza, e perde os contornos. O horizonte, antes projeção de muitos mundos, já não mais está. O que há atrás da chuva incerta? Se não passar, o mar subirá e morreremos todos afogados na dúvida de um sol mofado.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Do piquete ou porque o caos me agrega

Há cerca de duas semanas que convivo, na faculdade que trabalho e estudo, com pilhas caótica e objetivamente ordenadas de cadeiras. Há algo no apelo estético chamado por elas que fascina. Pro bem ou mal, tanto faz, mas chamam. E é esse chamado que me atenta a pensá-las.
A imagem imaculada da escola e, principalmente, da sala de aula, forjada pela disciplina e pureza exigidas dos alunos e professores, distanciam-nos de uma chave de concepção de sua existência. Lugar comum, hoje, crer que dispor as carteiras em círculo é uma forma “alternativa” de vivência sócio-espacial da classe, capaz de reestruturar a relação professor-aluno -em uma tentativa de resistir ao uso religioso do quadro-negro-branco-verde-touch como tecnologia de transmissão e materialização do conhecimento-, quando em verdade apenas põe-se em voga uma outra norma organizacional que não permite deslizes: ninguém mais à frente, ninguém mais atrás. Domínio visual pleno do professor sobre os alunos.
Ordem, clareza e igualdade (simetria): controle.
De toda forma, essa prática se restringe a limitado grupo de professores, que deu um passo à frente (ou sutilmente em uma diagonal) das cartesianíssimas fileiras, invariavelmente mapeadas, disciplinadoras do olhas docente, que se habituará à morfologia preestabelecida de cada turma, facilitando a compreensão comportamental destas, assim como seu controle. Pôr-se no seu lugar, da mesma forma, torna-se um hábito dos alunos. Essa experiência acompanha por um tempo cada vez mais prolongado a vida humana, que guardará essa nova verdade desde a mais breve infância.
Daí que nos deparamos, belo dia de greve, com as tais cadeiras empilhadas e, como se não bastasse, à frente da porta das salas de aula. Visíveis, também, pelos corredores, rampas de acesso, escadas e até mesmo junto a elevadores. Algo afeta imediatamente aquele altar esculpido em nosso espírito, travando imediatamente nosso passo, reduzindo a elas nosso ver e pensar, atacando nosso devir.
Dá-se então início a uma série de formulações sobre esta “entidade” com a qual confrontamo-nos, que tomam recorrente direção à repulsa e à raiva, traduzidos em resmungos e pequenas ofensas, mas que podem ganhar corpo num embate físico ou numa acalorada e ímpar discussão virtual que alguma rede social pode propiciar.
Dessa discussão sobre o viés democrático, ou não, sobre esta forma de piquete, me reservo a pensar uma segunda função que ele cumpre, para além de impedir que alunos e professores “furem” a greve votada em assembléia -essa também com uma forma bem cristalizada, apesar de polêmica.
Atrai-me -e até julgo bela- a agressividade com que a forma caótica do piquete atravessa o espírito. O ataque preciso às nossas expectativas de simetria nos afasta da sala de aula e nos põe num espaço alheio ao ordenamento do conhecimento. A falta do hábito de pensar basicamente qualquer outra vivência no contexto escolar possibilita por em xeque, ao menos momentaneamente, um dogma disciplinar moderno.
O campo de existências, inclusive acadêmicas, fora do lugar da sala de aula, torna-se imediatamente infinito. O piquete se coloca como proposta de uma coisa outra, indefinida, em lugar, que exige do sujeito uma ação. O caos propõe, ainda que algo difuso. Num instante, absolutamente volátil, a sala de aula não existe mais.
É esse ponto, breve momento de suspensão, que nos divide. Nossa capacidade para lidar com esse súbito ascender de violência coloca-nos, finalmente, prontos ao diálogo sobre o que ainda não tem lugar definido ou quem sabe, indisposto a existir fora de uma (bem difundida) norma.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

da vida BB

[Foto: Daniel Teixeira]

terça-feira, 17 de setembro de 2013

da vida T


terça-feira, 3 de setembro de 2013

do porquê Luiz Felipe Pondé (não) é necessário

Toda segunda feira, religiosamente, leitores das colunas de opinião do jornal Folha de São Paulo se dividem energicamente entre torcidas sólidas. Divididos os grupos do politicamente correto(?) e do politicamente incorreto(?), travam-se debates cegos e pantanosos que correrão ao longo da semana, sublimando com o sol de domingo. Eis o fruto do trabalho do doutor em filosofia Luiz Felipe Pondé.

Professor em duas universidades particulares de São Paulo, Pondé, valendo-se de seu pós-doutorado em Tel-Aviv e da publicação do "sucesso de vendas" Guia Politicamente Incorreto da Filosofia, angariou para si a disputadíssima coluna de segunda feira, responsável por criar as polêmicas necessárias à tiragem diária dos jornais de grande circulação. Sem falhar uma semana, pulam de suas linhas comentários imediatamente vagos e violentos contra minorias, políticas de afirmação, PT e, sobretudo, aos moralistas da imoralidade.

Há dias em que faz questão de defender o papel de objeto sexual das mulheres, que o feminismo tenta há décadas desmontar; há outros onde esclarece sua predileção pela marca de produtos de luxo Dior em detrimento da reprodução iconográfica do "assassino" Che Guevara; há o dia em que prefere falar sobre a condição a priori do mau-caratismo dos criminosos; melhores os dias em que justifica o programa de espionagem internacional dos EUA e o vasculhar das bolsas das empregadas atrás de um roubado pacote de carne porque, simples assim, é como funciona o mundo; hoje defendeu os médicos brasileiros com a certeza "de os médicos cubanos serem mal formados", assim como tudo na ilha caribenha, "com exceção dos charutos", e de ser o governo federal brasileiro baseado em retórica "fascista e comunista", assim, numa tacada só.

Opiniões que deixam muitos perplexos e atônitos, reverberam em outros com o sentimento necessário: paixão. A paixão, larga medida, vende. E vende bem. A tragédia, o absurdo, o polêmico, nada disso é novo ao jornalismo. A sutil diferença -e que, há de se convir, nem é novidade- é que agora possui diploma. Respaldo científico. "Formado na FFLCH, do que os comuna tão reclamando?"

Dentro do jornal, há uma outra engrenagem operando concomitante: a circularidade semanal. Todo domingo, historicamente, é publicada a edição mais bem trabalhada do impresso, concatenando todos os principais assuntos tratados na semana, encerrando um período bem delimitado de informações e abrindo as portas para as novidades que a segunda feira, agora como folha em branco, irá trazer. Esta, por sua vez, tem de ter energia o bastante para alavancar conteúdo para toda uma semana, até o encerramento no domingo seguinte. O expediente editorial, além da rotina diária, é cíclico semanalmente.

O (bem pago) papel assumido pelo articulista é, assim, necessário. Compramos a briga pela petulância, seja da crítica ou do criticado. Compramos, antes de tudo, o jornal.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

jesus manero

segunda-feira, 24 de junho de 2013

é nóis

Três reais, bom dia.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

sobre o joio, o trigo e o desespero

Caralho, o que está acontecendo?

O marulho da madrugada que me engole não fortalece o raciocínio, mas tange a eloquência dos respingos de olhos tão estatelados.

Porto Alegre, São Paulo, Fortaleza, Londrina, Belo Horizonte, Florianópolis, Aracaju, Vitória da Conquista... essas são as cidades noticiadas pela Folha. Essas são as cidades, noticiadas pela Folha, onde houve reação violenta dos manifestantes quanto à presença de membros de partidos nos protestos. Essas foram as cidades onde a Folha, talvez assumidamente, tenha presenciado o que de mais perverso tem acontecido no país.

Tive, ainda há pouco, diversos testemunhos de quem vivenciou a av. Paulista nesta noite de quinta feira. Nada do que ouvi, porém, teve parelho com os takes online dos jornais. Vivi relatos angustiados de quem desafiou, punho a punho, o neo-fascismo nacional.

Meu ímpeto por escrever esse texto se deu, principalmente, pela facilidade do discurso. Não o do meu discurso. Meu discurso é enviesado, rubro-negro, objetivado e, talvez, contraditório. Mas escrevo pela facilidade de conquista do discurso “anti-corrupção”; pela facilidade de conquista de uma bandeira verde-amarela; pela facilidade de permear terrenos do fascismo.

Há de se cuidar, num ambiente em polvorosa, das trilhas criadas pelo ímpeto. Às vezes, sabemos, ele acerta. Invariavelmente, entretanto, somos arrastados a armadilhas tristes.

Sejamos práticos: hoje, durante o que deveria ser uma festa-protesto chamada pelo Movimento Passe Livre, transformou-se numa demonstração do que há de pior no sentimento patriota. Skinheads, em sua acepção suja e conservadora, permeavam os espaços ocupados pelos manifestantes e faziam valer a persuasão emocional típica de momentos limite. Chamavam as pessoas à ação violenta contra as bandeiras partidárias e, não mais tanto surpreendentemente, angariavam adeptos sem muito esforço. Inúmeras pessoas, sem mesmo ter exata certeza do que faziam, bradavam palavras de ordem atrás dos skins, exigindo que se baixassem as bandeiras dos partidos. “Petralhas”, gritaram para militantes do PSTU. “Se a bandeira não baixar [...] o pau vai cantar”.

Jabor, Datena, Fátima Bernardes, Rafinha Bastos e a coitada de olho roxo, mesmo que não diretamente intencionados nesse sentido, alimentaram um veneno rancoroso tão mal direcionado, que a corrupção nos grupos políticos institucionais brasileiros se tornou o alvo central e, em sua personificação mais malacabada, o PT foi entalhado como o símbolo da desgraça brasileira.

Confesso, aqui, que não sou mais do que acham que ser petista é um ato político de resistência. Porém, tenho a obrigação de pontuar que, quando os punks e os anarquistas da cidade se sentem na obrigação de formar uma corrente de proteção ao PT, dentre outros tantos partidos políticos que possuem qualquer tipo de compromisso com os grupos sociais envolvidos na manifestação, algo deve ser assumido como embaralhado.

Nós –e aqui estou pontuando a largura máxima da boa vontade das pessoas que conheço e convivo– que estamos de alguma forma tentando afastar o peito dessa insanidade antes de apontar o dedo, temos de ficar alertas com os grupos, virtuais e citadinamente mobilizados, que estão se valendo de um discurso nacionalista para angariar adeptos a uma luta que só beneficia a direita conservadora brasileira.

O fascismo é uma caricatura mal feita de uma piada de domingo. Mas a piada de domingo só tem graça pois não faz mais parte de nosso convívio. Ou pelo menos não fazia.

Hoje me deito sabendo que o inimigo dorme ao lado. É meu vizinho, que tão bem intencionado cantou o hino nacional no ato de segunda feira, que hoje engrossa o caldo violento que tenta afastar as propostas críticas das manifestações.

Aqui em São Paulo, um pouco antes do pessoal dispersar, os integrantes Fo MLP foram expulsos a tapa da Paulista. Eles, que tiveram a nobre responsabilidade de, certa forma, responder por essa massa amorfa que gritava “vem pra rua vem”, foram postos pra correr do ambiente democrático que haviam idealizado. O role foi pervertido.

Há algo de golpista entrelaçando parte das entrelinhas desse discurso que evita citar a presença da extrema direita em São Paulo. Há algo de golpista pontuando as minorias vândalas, dando homogeneidade a manifestações absolutamente heterogêneas. Há algo de golpista na mídia.

Há uma morte oficial e outras tantas não declaras. Essa noite sangue corre nas vielas do centro de SP. Essa noite o vazio ideológico de um conservadorismo violento faz valer os dias de treino gastos em academias de muay thai.

Quebraram e queimaram bandeiras Brasil afora. Quebraram e queimaram bandeiras que não eram símbolos de opressão. Quebraram e queimaram, Brasil afora, em nome do Brasil, ideais.

O fascismo que se esconde na ação nacionalista é delicado. É delicado pois a bandeira é um símbolo que agrega, que representa. Nesse momento de instabilidade, “não somos partidos, somos o Brasil”, repetem. Não tem idéia do que repetem. Esse discurso, que coloca a adoração a um símbolo acima da reflexão e das relações sociais, justificou a primeira e a segunda guerra. Justificou ditaduras na Espanha, em Portugal, Itália, Chile, Argentina... Brasil.

Estou absolutamente confuso nesse instante. É muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Brasília, Campinas, São Paulo, Belo Horizonte, Florianópolis... e tudo o que vejo é fascismo.

A festa cívica que a mídia está chamando não é mais o ambiente reivindicativo do início de junho. A horizontalidade do MPL foi posta abaixo por grupos que entendem o PT como o câncer do país. A horizontalidade do MPL foi posta abaixo por gente que acredita que o vermelho é a cor da doença.
Essa noite durmo mais rubro-negro do que nunca.

Durmo com o vermelho solidário dos camaradas que hoje peitaram o fascismo nas ruas.

Durmo com o negro apátrida de Malatesta e Goldman. Com o negro punk das esquinas da paulicéia.

Essa noite não durmo, de tanto que preciso dormir.

Peço, por fim –sem entender ainda que isso é um fim–, que atentem a qualquer grito patriótico tentador que possa ecoar nos ouvidos nesses dias. O hino nacional entoado nas escadas do metrô, hoje, só tendem a destruir qualquer processo libertário que possa ter construído essa possibilidade.

Ignore os fascistas! Ignore os conservadores! Fortaleça seu convívio crítico!

Diversas cidades estão em alerta as ações da direita!

Em meu nome, com carinho aos partidos que lutam, aos anarquistas, aos punks, aos libertários, aos comunas e fudidos na vida,

Bons sonhos.

Tom

segunda-feira, 17 de junho de 2013

do aflito sonho de véspera

Cai e vai assim, como quem
lava o sangue ainda
em potência, de veias
tantas, abertas
de algo tão próprio por
ser árabe, latino...
Muda, diz-me tanto pela
cadência. Continuidade, limpeza
ou mesmo
inocente ‘quem sabe’.
Embala esperança tanta
de ser noite última de sonhos
trôpegos de quem ainda
não fez verão.
Cairá, uma vez mais, para dar adeus
ao que nunca
devia ser.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

de não entender por não saber de onde vem


Começou mal quando machucou a própria mão ao socar a mesa, tentando explodir o choro que não vinha. Envergonhou-se de sua fraqueza e implodiu em fúria silenciosa. Era tudo o que poderia dar de si naquele momento: num sobressalto da demência, transpôs sua mudez ao corpo e fatigou o ânimo, numa falta de proposição resolutiva óbvia. Daí que enclausurado meteu a respiração em linha assíncrona e já nem sabia mais por onde tinha começado.

Ora, que nos autos éticos de seu amor aquilo era impensado -não errado, nem indevido, mas fora de questão-, ficou claro. Porém, então, o quê? Ensimesmou-se encapuzado da calma até no banho, amargando o enxágue inútil de corpo ainda sujo e a vitória do instinto débil.

Estava -achou- tão só e desprotegido, que o óbvio esquinou com egoísmo e ingenuidade, crendo que havia ali vice-versação de menos. Colocou-se num prisma conjugal que nem sequer imaginava existir, mas que marulhava em tantas formas indistinguíveis de seu outro lado, e findou sem entender-se.

“Vermelhidão do corpo, erro pois
vi além do real ou,
apenas, malquisto cérebro mal enviesado
e alertado imbecilmente, disparatando
tantos absurdos inomináveis pra,
nem menos nem muito menos mais,
agitar as saudades mal levadas
de tanto morrer entre quatro paredes?”

Nem mesmo colocou o ponto na interrogação, os olhos de vermelha confusão já haviam fechado aos horrores criados por falta de tato, sonhando com gatos que não se molham e mãos sempre juntas.

sábado, 18 de agosto de 2012

do longo barco de um dia só


Ainda deformados por
recente corpo, colchões
mareiam
a saudade.
Longo o dia passado apartado
do cuidar. Cuidar de si, bem
dito, há-se também
no outro.
Tranco-me por simpatia ao
isolamento necessário, mas
recuso plenitude quando
cada ponto
pede mais. Mais um. Mais
todos
os que me der.
Mais todos os que topar
trocar.

***

Meu pobre amigo olhou desconfiado
quando do despertar
prematuro: "Que há? É comigo?"
Nem contigo, nem comigo: hoje é
para os outros.
Sorte tive nem. Foi-se sem caber-me.
Fiz-me masculinizado
e arqueei o lombo de mãos
no bolso,
catando moedas, chutando latas.
Dormi tão mau que de sono acordo pesadelado,
sonhando nunca ter
então dormido.
E dia que passa assim, acordado
no azar, passa reto
de nem ter sido feto.

***

Limpo, respiro fundo os
desajeitos das outras convivências
comunais: panela sumida.
Comida de menos,
bicicletas demais.
Meditação de menos,
riscos demais.

***

Rogo, em corpo de fundo
de rompidas formações,
por calma.
Insistir no que é
tendo sido e hoje
transmutado em
querer-me bem é
tontisse sobressalente.
De tanto tentar esquecer,
fiz-me lembrar
do que nem sabia.
É assim, cavando o nada que
enchemo-nos de pouco
que adianta em ré para o futuro.
Sei que disso não ficará além
de garoa seca, pois
ganhei bem
sorrisos demais
de meu bem.

***

Encerrar, enfim, a espera com
amor.

terça-feira, 24 de julho de 2012

sexta-feira, 6 de julho de 2012

sobre a pretensão do 'me merecer' e sua singular verdade

Meu corpo, meu templo.
As verdades ensaiadas do crescer fizeram-me
caminhar no sinistro, no medo.
De covarde e assim por tanto,
sorri enfim.
Temos dessas de achar que
é isso ou aquilo,
mas eis que um nem outro:
te pegam no colo então, colocam lá
em cima e
te fazem por merecer.

O ego faz entender, enfim,
um valor intrínseco: temos
em nós um sopro de lucidez que,
bem usado, faz-se valorar
em prol do próprio bem,
de forma sã, saudável.

Aceitar sem ar
doentio é, para todos
os efeitos,
o esbanjar do júbilo sua necessidade
de ocasião repetida
em dia-a-dia.

(Berlin, junho de 2012)

sexta-feira, 8 de junho de 2012

do ainda novo


O que? Por que? Não
sei. Não
faz diferença.

Ouviu-me em preces
ligeiras, resgatando-me de eternidades
imutáveis. Fez-me, enfim,
viver mundo novo,
interpretando e recriando doces as saudades e
ansiedades.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

do trem diário - parte I

O vagão parou. Meu corpo não respondeu, mas o fim do movimento foi nítido. Brusco e imperceptível. De início os olhos perdidos cantaram dúvida, mas o instante seguinte coalhou o ambiente de pavor. Os corpos movem-se lentos, em direção a frente do trem. Tudo tão devagar, lento, dançado, e todos entendendo que jã não possuem controle algum sobre seus movimentos.
Os cabelos ficando para trás, esvoaçantes em sua própria inércia. Peles que se retorcem como que esmurradas num ringue profissional.
Por que não me mexo? meu corpo está congelado, travado, como se nada estivesse acontecendo. A lentidão do desastre leva as súplicas ao limite, com íris que se dilatam, gritando o que o corpo emudeceu.
Reparo no garoto que estava ao meu lado, indo de encontro à senhora que antes se escorava na barra de apoio, que agora se funde com ela. Pele de sobra abraçando brilhante metal. A qual velocidade estávamos? 50, 60, 70 quilômetros por hora? São todos uma sádica versão em câmera lenta daqueles bonecos que se destroçam em testes de batida de carro. Corpos flutuando, reconstruindo anos de teorias corpo-tempo, dilatando o desespero de uma fração de segundos numa eternidade poética, quase valsada.
Sinto uma pressão nas costas, um bocado macia. Sinto junto o desespero de alguém que tem os órgãos pressionados e sente, segundo a segundo, a angústia da impotência. Demasiada experiência.
Os vidros, já estilhaçados, começam a alcançar os que estão próximos da janela. Peles macias e sujeitos incapazes de oferecer resistência, aprendendo que resignação não é arte que se aprende no instante, mas que faz falta tanto quanto ópio e vigor físico.

uma véspera


Trsss! É mais complicado que isso, mas o som de um fósforo que risca a caixa e começa a queimar, estalando sua delicada e anêmica madeira, é a única forma que encontrei para ilustrar minha cabeça nesse instante. Decerto que só uma tentativa de fugir de mim, esse inventar de histórias. Ao menos passo o tempo, espero o sono.
O teto dessa sala está sempre claro. Dias e noites podem iluminar a imundice que ocupa a parte de baixo da geladeira ou esconder armadilhas de comida e latas pelo chão. O teto, este porém, é sempre amarelo. Quem será que escolheu esses canos assim, pulando pelas paredes, furando o teto? Se pintassem de vermelho, desse com cara de salva-vidas, ao menos daria um ar kitsch para essa cova.
Os passos no corredor param cerca de dois metros antes de se alinharem com minha cama. Deve ser a puta da espanhola do apartamento ao lado. Como pode todo o sexo de flamenco de minha namorada ter sido parido de uma língua qu produz esse tipo de filha da puta? Não ouço-a, mas sua voz me atravessa o espírito com escárnio.
Procuro meu sono, mas não o acho. Confundo-o com aviões, com trepadas inesquecíveis que ainda nem vivi, com rejeição e azar.
Meu pé, esse ao menos, não fica balançando, como esses que provocam um som abafado e raspado que hipnotiza pela cadência de enfastio. Não sofro disso. Ao menos não disso. Quem sabe não seja apenas meu dedo se fingindo de morto, por tanto descuido.
C'est ma ticket. C'est ma billet du avión. Ma? Bosta! Não fosse o medo grande o bastante, coreografar uma conversa com alguém do consulado ainda me é obrigado a ser feito acompanhado de um alarme. Não tem cara de ser de um carro. Podia bem ser o malquisto daquele parasita careca, com quem me pego fantasiando um crime louvável.
Será que ela dorme? Desejo que sonhe algo bom.
Parou. Fazer o bem em pensamento, agradar Deus, se convencer de que isso pode mesmo desligar um alarme. Ponto final pro dia, pelo menos.
O olho que arde implora que seja a mente que paguenpor seus próprios pecados. Ocupe-se a sanidade da ansiedade. O corpo implora e o braço já sente.
Se vira.

domingo, 29 de abril de 2012

do súbito


E então vem o sono. Uma vontade súbita, intensa, percorrendo cada poro, de abater o dia em cama solitária qualquer. Vontade enraizada de ser acolhido e ficar sozinho, deleitando-me do prazer narciso de ser cuidado e não cuidar. Ânsia por receber. Ausência criada atemporal, fortalece o amargo da alma, que contradiz-se na própria verdade criada no hiato espacial.

Durmo. Penso em como amolece a alma a cada desencontro da palavra; em como escorre forte olho adentro a certeza da saudade.

sábado, 28 de abril de 2012

nosso

dela

Aturdem os olhos em surpresa
ingrata, investindo contra a
graça, da moça
sem roupa
da foto me dada.
Ora, quem faz da farra
dela, que caça a própria
carcaça de vida e verdade,
um tropeço no outro, de
susto sem
merecer?
Um puto sem alma, que
Deus ou não sei, mas culpa
nenhuma
que do sacana azar.
Fosse-me dado, poder ou
acaso, far-te-ia toda
suprema de si.
Esvai e volta, sorrindo
ou robusta na ruga
da ira, és
minha dama, faz-me
vivo e
futuro no
hoje.

meu

Quantos segundos leva um estômago para se retorcer de tristeza? Nenhum. Não tenho dúvidas: nenhum. Certos poemas, de escárnio querer, de vida e sofrer, atingem com fúria e desprezo, em instante tão luz de quase não ser. Honesta no outro, de resposta aviada, não exita o jazigo tão junto e idiota. Queixado de si, inútil em servir, sofre a infâmia dela e cerra peito junto. Ego achatado, por lembrar-me não tudo, duela a alma com atenção pra ser dada. O espírito grita pelos dois, mas o tapadinho padece e a vista entumece em diálogo aleijão. Ama. Ama de se olhar de fora e sentir calor. Mas dói no peito o sabor da distância incolor. Vida, tão querida, aproxima-se.

Por hora, chora por fora e sorri o querer. Sorri sempre, pois com ela aprendeu.

sábado, 21 de abril de 2012

- As boas decisões são tentativas inúteis de interferir nas leis científicas. Originam-se na mera vaidade e o resultado é absolutamente vil. Proporcionam a nós, de vez em quando, uma ou outra emoção estéril, luxuosa, que guardam certo charme durante uma semana. Isso é tudo o que podemos dizer delas. São reles cheques que os homens sacam cotra um banco em que não mantêm conta.

O retrato de Dorian Gray - Oscar Wilde

sábado, 14 de abril de 2012

do ciúme


Do outro se é o que foi
dado. Nada além o espontâneo pertence
alma alguma, senão si.
Mas daí que olhos vesgos se
perdem em devaneios de não
se saber
devanear, ocupando a cabeça de
caraminholas tão inúteis que
(h)a(´) vergonha(.) lhe obriga ir além:
o que fiz? Por que fiz? E de que
me serve? A quem serve?
Espíritos ruins, existindo, certamente
disso ocupariam-se.

Nada muda em seu cerne. Nada.
Não para pior, ao menos.
Mas algo de maligno permeia
as veias da emulação; algo que...
algo que não se encaixa com a liberdade.

Somos e fazemos por razões que,
óbvio, as vezes nos escapam,
mas ainda assim, fazemos.
Nós fazemos. Eu faço. E é meu.
A propriedade só existe sobre si.
Involuntária, espontânea,
irracional ou o diabo
a quatro:
ela existe apenas sobre si -ou assim
ao menos haveria de ser...

No mundo de dois em um, nada mais
infértil que
a posse.

Somos do outro o que ele nos permite e,
em nenhum lugar além de aí, resíde
a felicidade plena.

Sou, nestes termos, pleno. Feliz.

domingo, 1 de abril de 2012

dos ganhos ao sorrir

E vai. E vai. E vai. E como pensar
sem fim, refeito em ideia fixa, certo
por ter acertado -ter sido acertado-,
colo mãos ao rosto,
escondendo o pranto do sorrir, matando
os dias afoito por reviver
o que se sabe.
O sorrir, quando certo, não deve
ser evitado, desestimulado, maltratado:
recomponhamo-nos nas brevidades
do que temos, nas declarações, nas
juras e no que nos faz um.

*

Calo-me.
A força do que tenho evita o pensar.
Vou sendo, querendo e sorrindo aflito,
gozando mediante querer o vir a ser.
Perplexo por tantos pontos, comuns
em ser, agradeço tê-la nos sonhos
de vívidas sensações pelo logo menos.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Oh, what I've been missing...

http://www.youtube.com/watch?v=mJrhOjvDbtg

sobre meu amor


Nessa hora me vejo cercado de certezas: um caso acertado, um trabalho rentável, viagens marcadas, línguas que em breve estarão ali, sentadas em minha boca, sorrisos de satisfação por tanto que ainda não sei o que contém de verdade. A questão, de fato, é que pouco importa: há algo de sublime –tão sublime que perdido no tempo– nisso que me toca o espírito; algo de tesão nisso que me é ideia fixa, ideia acertada, ideia futura por acerto de dias tão pouco passado. Nessa hora sinto-me tocado pela morte, que me diz em sussurros compassados de bop-paixão: “vês, finalmente, a vida? Aproveitais enfim o que lhe tomaram nestes anos. Confessas-te a esta mulher. Assumais o sumo de vida que crês fato futuro com tal bela dama.”  Está certa a morte: faltou-me vida, que agora encontro em vivas sensações de breve memória recente.
Ah! A vida! É disto então que dizem ser o sangue quente, de não ódio que tanto sorrir. É deste sentir que faz-se querer mais de si, do próprio sangue com a pele alheia, em vida nova de um dia quem sabe. É (afirmação corajosa) você.
Cadência de teclas tomam o tempo que escorre pela saudade, mas há valor naquilo que é criação divina. Há sempre valor no divino. Há valor no platônico. Há nós nisso que é de vazio no espaço ocupado por um oceano. Somos tanto nisso que a desverdade de ser e estar nos exige provação. Estamos tanto por nós mesmos. Enxergo sem titubear: acertamos, meu amor.

segunda-feira, 26 de março de 2012

sobre saudade


Não me assustas: desejo-te.
A verdade sobre o tesão nada é
mais que meu arrepio
honesto sobre pele precisa.
Cabeça que sublima,
corpo e alma teus:
fui entregue, sorri por fato e concordei:
assim sou o sorrir.

Ora, estrada tortuosa de vir a ser
é impacto aos olhos de Adão,
mas a Serpente tem sua razão
e Deus nada pode fazer:
somos o pecado
e assim sorriremos.

Hoje mar vai, leva
olhos salgados,
mas não desonesta: somos
em ontem e amanhã.

Realmente o somos.
Pele e suor de um mesmo impulso,
refazemo-nos em mútuo
jantar. Pecado aos outros,
somo-nos.
Que assim seja.

quinta-feira, 22 de março de 2012

(...)
Everybody's hiding something.
That's what I'm after.
(...)

___
Trecho de carta de Jack Kerouac para John Clellon Holmes, 24.jun.1949

terça-feira, 20 de março de 2012

dos olhos semi-cerrados


Quando a vida está mais arrastada, a cabeça acelera e sonhos lúcidos se tornam válvula de escape. No trem, vejo todas as garotas e, em minha miopia, todas são você. É como se eu pudesse olhar para cada uma e receber teu sorriso de volta, tornando a saudade algo distante...

Mas você não está aqui e eu se disso. Há algo de desejo e completude no espírito, que não exito em aceitá-la em mim como criadora de movimento. Fui posto em estado de emergência e é como se fosse essa a condição humana necessária. Delirium Tremens pela ausência, pela ansiedade, ao passo que embriagado de recordações ainda tão quentes no travesseiro, que os poros, cada qual, entumecem-se de viscoso torpor.

Em trânsito ainda por ruas tão batidas e frias, o muro se torna horizonte, transparece e lá volta você: sólida, certa. Dou voltas em falsa superstição por adiantar dos fatos. Antecipo sorrisos, transas, sustos, brigas, embriaguez... Antecipo a certeza do futuro -esse, tão incerto que a ansiedade física extrapola os controles da meditação. Assintomático de outra coisa qualquer que não do sorrir que me deu, torno-me estático à essências que já desconfiava. Recrio-me, invariavelmente, sem me mover. Movo-me para me lembrar do mesmo que sou. Volto a você: aperto o peito e apago afogado no teu desespero. Mãos minhas que tão suas, cortam o ar por impotência frente o baque compassado da máquina. Lembro-me de meus espasmos de credulidade e os ponho à frente: retorna-me com pedras de quem se apoia no virtual pela perda do chão. Aceito. Entendo. Sofro junto.

Don't get angry with yourself: I'll heal you!

A ansiedade toma foco, multiplica-se em destinos e consome-se em úlcera. Tão pouco sou pois tão pouco me criei. Assumo a responsabilidade, pois diferente não poderia ser. Ao menos não sem covardia. Ao menos não sem ludibriamentos da ética. Éticas não são flexíveis.

Rogo calma, entendimento do outro, providência divina e auto-estima. O desespero nos leva a lugares inimagináveis. Desafio-te a, com isso, sublimar a voz embargada: cada pontinho teu: amo.


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http://www.youtube.com/watch?v=bcw0y_-llhg